Passado e futuro são contemplados com traços artísticos e históricos de autodidata na cidade de Quixadá
Quixadá. Retratista, desenhista, caricaturista, compositor, músico, regente, artista plástico e muito mais. O ex-servidor do extinto Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), Raimundo Waldizar Viana, 70 anos, compara suas atividades artísticas a uma salada cultural. No atelier montado no sobrado de sua casa, de janelas abertas para a brisa do Jaguaribe, o autodidata divide sua criatividade entre tintas, memórias e notas musicais. Observar as telas espalhadas por todos os lados é rememorar as origens de sua terra natal, a amada Quixadá, dos exóticos monólitos sertanejos.
Nas explicações do artista se percebe a importância das pinturas, nas misturas de tons e momentos históricos. “Esse calhambeque é do Dr. Brasil Pinheiro, num passeio com a família sobre a passarela da barragem do Açude do Cedro, numa tarde de 1924. Não me falha a memória e muito menos a retina. Tenho a fotografia como prova”, comenta, sorridente, sobre a proeza da época retratada pelas suas mãos. Cita os espaços preenchidos a óleo como um de seus estilos prediletos na arte da pintura. Fácil de interpretar e difícil de questionar. Simplicidade e verdade em tons quase reais.
Todavia, o simpático semblante logo muda, ao ser indagado sobre a arte ao lado, o enorme casarão azulado: “Era o nosso Paço Municipal construído em 96. Nos idos de 1800. Foi demolido pela insensibilidade de nossos políticos. Alegaram que havia rachaduras nas paredes, mesmo tendo cada uma delas praticamente um metro de largura. Desculpas que nem trouxa acredita”, completa o artista, lembrando que sua indignação é compartilhada pelo amigo e também pesquisador escritor João Eudes Costa. No livro “Retalhos da História de Quixadá”, cita o desastre histórico.
Daquela época restou apenas um de seus muitos dons, o de ilustrar a capa da obra literária de 600 páginas a resgatar o passado de sua cidade, a “Terra dos Monólitos”. A habilidosa arte, aliada à afinidade conservacionista, contemplaria o livro seguinte do escritor conterrâneo, “Escravos da Terra Seca”. O mais recente trabalho do memorialista, “Ruas que contam a história de Quixadá”, a ser lançado brevemente, também recebe a capa de Waldizar Viana. “Não é por menos. História e arte se complementam”, diz o escritor elogiando o ilustrador.
Reconhecimento
Foi justamente a admiração do público que o artista polivalente recebeu na sua primeira exposição individual, em Quixadá. O entusiasmo o encorajou a participar no XX Salão Municipal de Abril, no ano seguinte, em Fortaleza. Cinco anos depois voltou a expor suas obras na Capital, no VIII Salão dos Novos, na Galeria Antônio Bandeira. Após breve experiência como desenhista publicitário, recebeu formação básica na Casa de Cultura Raimundo Cela. Ali expôs pela primeira vez, no ano de 1980.
Os convites não cessaram mais. Em mais de 50 anos dedicados às artes plásticas, Waldizar Viana já perdeu a conta de quantas exposições participou. Não esquece, entretanto, da homenagem recebida pelo então presidente da Câmara de Vereadores de Quixadá, Cristiano Góes, quando, no Centro Cultural Rachel de Queiroz, foi agraciado com duas comendas. A primeira pela ilustração do primeiro livro de João Eudes Costa e a segunda pelo trabalho à frente do Grupo Coral Vinha de Luz, do qual é fundador e também regente.
APRENDIZADO
Regente fundou Banda de Música
Quixadá. Quanto às habilidades musicais, Raimundo Waldizar Viana diz ser do sangue. O pai, Raimundo Viana Ferreira, era músico. O restante da família também. Aprendeu com eles os primeiros acordes e o gosto pela boa música. O interesse foi tamanho que, além de letrista, arranjador e regente, foi um dos fundadores da Banda de Música de Quixadá, aos 28 de março de 1968. Depois de 30 anos, resolveu criar o coral ecumênico.
Em maio deste ano, o grupo composto por 20 integrantes completou 10 anos apresentando espetáculos voltados à doutrina espírita, crença à qual Waldizar se converteu.
Foi no Espiritismo que ele encontrou forças para se livrar da boemia que se prolongou até os 40 anos. Não demonstra qualquer aptidão mediúnica, no entanto, acredita na existência do espírito eterno como fonte de suas inspirações, quer seja na ponta do lápis, — a esboçar mais uma de suas obras, “O Abandonado”, retratando o homem do campo no Sertão do Nordeste —, ou na criação de mais uma partitura para o chorinho dedicado ao seu filho D´arsonval, 21 anos.
Viana resolveu dar ao filho o nome do inventor francês encontrado nas páginas do livro “Contos e Apólogos”, do psicógrafo Humberto de Campos.
Minha vida
Nas escolas onde estudava, Waldizar era alvo de repressão dos professores porque, vez por outra, passava a rabiscar livros e cadernos. Nem os muros da escola escapavam. Era comum vê-lo desenhando figuras com carvão. Afinal, o gosto pela arte manual havia surgido nas paredes da vizinhança, nos desenhos de outros artistas. Essa passagem da infância estará registrada no livro que escreve sobre sua própria vida.
Sem data
“Minha Vida ... Minha Artes” não tem data definida para conclusão e nem a publicação. Enquanto a edição não chega, o artista deixa escapar trechos como o sonho de um dia poder estudar numa escola de Belas Artes, preferencialmente em Viena, na França.
Ele espera que seu sonho se concretize com a valorização de seus quadros antes de sua morte material, fugindo a regra do mundo artístico, onde as obras de grandes pintores ganham cifras astronômicas somente na posteridade.
O outro desejo é contar com um belo modelo feminino para concretizar uma pintura de nudismo no seu atelier. Ele acredita que se a oportunidade ainda não surgiu é porque aguarda a companheira amadurecer um pouco mais — ela é 40 anos mais nova —, pois o que não falta em sua terra natal é mulher bonita.
No entanto, enquanto esse dia não chega, Raimundo Waldizar Viana se dedica aos diversos estilos de pintura. Por falar nisso, ele contou que seus estilos preferidos são: o Retratismo, Realismo, Surrealismo e, também, o Cubismo.
SAIBA MAIS
Retratismo
É uma pintura, fotografia ou outra representação artística de uma pessoa. O mais famoso exemplo de uma obra retratista é a ´La Gioconda´, de Leonardo da Vinci. Os fotógrafos aprenderam com os artistas plásticos, a famosa regra dos terços.
Realismo
Surgiu na França no período das primeiras lutas sociais, sendo também objeto de ação contra o capitalismo progressivamente mais dominador.
Cubismo
Tendo como principais fundadores Pablo Picasso e Georges Braque, ocorreu entre 1907 e 1914. Tratava as formas da natureza por meio de figuras geométricas, representando todas as partes de um objeto no mesmo plano.
Surrealismo
Surgiu em Paris dos anos 20, enfatiza o papel do inconsciente na atividade criativa.
Mais informações:
Atelier Waldizar Viana, no município de Quixadá
(88) 3412 0347
E-mail: magusmasn@hotmail.com
ALEX PIMENTEL
Colaborador
Diário do Nordeste
domingo, 23 de novembro de 2008
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