quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Esplar alerta contra cultivo transgênico


A possível instalação de uma empresa de sementes transgênicas preocupa produtores do cultivo orgânico

Quixadá. Os avanços conquistados pela agricultura familiar com a expansão da agroecologia nos sertões do Ceará e do Nordeste podem estar ameaçados. A situação de risco surge com a decisão do Governo do Estado de implantar uma indústria estrangeira de sementes transgênicas passando a produzir e cultivar grãos geneticamente modificados. A denúncia é feita pelo engenheiro agrônomo Pedro Jorge Lima, um dos promotores do cultivo ecologicamente correto voltado para a cotonicultura no Nordeste. “Caso a Agencia de Desenvolvimento do Ceará (Adece) insista na produção diferenciada, toda a cadeia produtiva do algodão orgânico, apontado como importante suporte para os pequenos produtores, estará comprometida”, afirma o agrônomo.

“Hoje paira uma séria ameaça sobre essa atividade com a possível introdução do cultivo de variedades transgênicas de algodão, pelos riscos de contaminação do algodão agroecológico, quando cultivado em áreas próximas. É imprescindível que as organizações de agricultores familiares envolvidas na produção agroecológica, as ONGs, o movimento sindical de trabalhadores rurais e os movimentos sociais se mobilizem para evitar que o Governo do Estado concretize o apoio prometido à empresa chinesa BioCentury Transgene, disposta a instalar uma de suas unidades no Ceará para produzir sementes transgênicas, o que é algo desnecessário, inútil e prejudicial ao desenvolvimento da agricultura familiar de base agroecológica no nosso Estado”, ressalta o especialista.

A preocupação não é por menos. Há pouco mais de uma semana o jornalista Egídio Serpa, colunista do Diário do Nordeste, divulgou em sua coluna o encontro de empresários chineses com o governador Cid Gomes. Na ocasião, os asiáticos comunicaram que a maior empresa na área de transgênicos da China, a BioCentury Transgene, instalará três centros de pesquisas no Brasil. Uma no Sudeste, outra no Centro-Oeste e a última no Ceará, “e isto já está decidido”. Produzirá sementes de algodão e mamona. A informação foi passada pelo presidente da Adece, Antônio Balhmann, ao colunista. O titular da Agência ainda expôs sua visão otimista. “Se tudo der certo, a BioCentury Transgene estará instalada e produzindo aqui em 2009”.

Além do articulador do Esplar, representantes dos sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras rurais espalhados pelo Sertão Central discordam do projeto a ser implantado pelo Governo. Recebem a decisão como uma grave ameaça. Dois dias após a comemoração da publicação sobre a expansão da produção de fibras orgânicas no Estado, no Diário do Nordeste, não se conformam com o que consideram decisão unilateral do governador Cid Gomes. Não foram consultados e sequer informados das estratégias governamentais para retomada da cotonicultura no Ceará. Não imaginavam a pretensão do Governo na instalação do laboratório de alta tecnologia e a produção das sementes já a partir do próximo ano.

Marcha agroecológica

Um dos maiores sindicatos de trabalhadores rurais do Ceará, o de Quixadá, com mais de 6 mil associados, avalia a possibilidade de promover uma “marcha agroecológica” até a Capital. Pretendem alertar o chefe do Executivo estadual acerca dos prejuízos que serão causados na base da agricultura familiar organizada no semi-árido caso a parceria internacional venha a se concretizar. Estão preocupados com os riscos de contaminação das variedades transgênicas a serem introduzidas na região. “Não deu nem tempo para a gente comemorar a publicação do jornal. Ainda estávamos distribuindo a reportagem nas comunidades quando fomos informados do perigo”, desabafa a sindicalista, Lucilene de Paulo.

A Associação de Desenvolvimento Educacional de Tauá (Adec), responsável pela comercialização do algodão orgânico produzido no Ceará já havia divulgado a ameaça. Um cordel criado por um representante da Adec, no ano passado, aborda justamente a preocupação da cadeia produtiva rural com a manipulação genética vegetal. Sugerem como alternativa o zoneamento rural excluindo o semi-árido dos algodoeiros mutantes. “Se abelhas e insetos levam o grão de pólen de uma planta transgênica, fazendo o cruzamento, a desgraça está feita, não tem arrependimento”. Essa é uma das estrofes de José Rogaciano Leite, um dos mobilizadores da Adec, demonstrando a preocupação com a transgenia.

Quanto a mamona, sindicalistas e especialistas não vêem muitos obstáculos, desde que seja plantada em áreas previamente demarcadas e destinadas exclusivamente à produção de biocombustíveis. Reconhecem a carência da matéria-prima para abastecimento da usina instalada em Quixadá. Desde que venha a gerar dividendos para o agricultor, sem agredir a natureza e nem afetar a cadeia algodoeira orgânica, as sementes da oleaginosa biotecnológicas são bem-vindas. Entretanto, não poderão ser utilizadas no plantio consorciado orgânico. Esperam, porém, haver as mesmas garantias asseguradas na produção do algodão orgânico. Bom preço e certeza de compra.

SAIBA MAIS

Agência

A Agência de Desenvolvimento do Ceará (Adece) foi criada no fim do ano passado pela Lei 13.960. É vinculada ao Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico e tem por finalidade executar a política de desenvolvimento econômico, industrial, comercial, serviços, agropecuária e base tecnológica, articulando-se com os setores produtivos e objetivando a melhoria de vida da população cearense.

Legislação

Em dezembro de 2003, o presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei da Agricultura Orgânica (Nº 10.831 ). Além de considerar sistema orgânico de produção agropecuária todo aquele em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis a minimização da dependência de energia não-renovável, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, e a proteção do meio ambiente, estabelece multa de até R$ 1 mi para quem violar o dispositivo legal.

Modificação

Um organismo é considerado transgênico quando é geneticamente modificado através da mistura de genes de espécies diferentes. Essa técnica foi apelidada de ´recortar e colar´ e desenvolve novas características aos organismos. Hoje é praticada com mais intensidade na agricultura com o fim de criar alimentos fortes que resistam aos herbicidas, pragas e ao clima e também para deixá-los mais nutritivos.

POSIÇÃO DO GOVERNO

SDA confirma apoio à agricultura familiar

Quixadá. Até o enceramento desta edição, a Adece não havia se manifestado sobre a possível instalação de empresa asiática para produção de sementes transgênicas no Estado. Por meio de sua Assessoria de Imprensa, a reportagem indagou acerca da confirmação da implantação da indústria chinesa o do cultivo de sementes transgênicas de algodão a partir do próximo ano no Estado, bem como as vantagens e o funcionamento. Foi solicitado ainda o posicionamento do representante da Agência e do próprio governador acerca da preocupação das entidades envolvidas no consórcio agroecológico que se expande no Ceará.

Representando o Estado, o coordenador do Programa de Biodiesel da Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA), engenheiro agrônomo Valmir Severo, confirmou a proposta dos investidores asiáticos ao Governo, todavia justificou que as políticas públicas no Ceará estão voltadas para o fortalecimento da agricultura familiar.

A prioridade é o desenvolvimento de culturas que geram gêneros alimentícios. Qualquer decisão a respeito do assunto não será adotada antes de uma discussão técnica entre a SDA, Adece, Embrapa e representantes de movimentos, associações e sindicatos de trabalhadores rurais, segundo garante.

Articuladores de organizações envolvidas com a produção agroecológica, dentre elas o Centro de Pesquisas Esplar e a Adec, ainda os sindicados de trabalhadores rurais de Quixadá, Tauá, Canindé, Choró, Banabuiú, Massapé, Forquilha, Santana do Acaraú, Aurora, Barro, Missão Velha e Milagres, representando várias regiões do Estado, se mobilizam no sentido de encaminhar à presidência da Assembléia Legislativa solicitação para a convocação de audiência pública para discutirem o assunto.

No pedido, a notícia da introdução do cultivo de variedades transgênicas de algodão é citada. Segundo o grupo, a produção de algodão orgânico em rama atingiu 80,5 mil kg este ano no Ceará.

ALEX PIMENTEL
Colaborador

Mais informações:
Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Ceará
(85) 3101.8000
Esplar - Centro de Pesquisa e Assessoria, (85) 3252.2410

Fonte
Diário do Nordeste

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